Meu nome é Luíza Alvim, sou pesquisadora de Cinema e viajante pelo mundo.
Em muitas viagens, procurei locais de sequências importantes do cinema. Outras vezes, visitei lugares e descobri os filmes depois. Numa terceira categoria, o motivador foi um livro que tenha sido adaptado pelo cinema. Faço aqui uma montagem com textos e fotos dessas experiências.
A Paris de Robert Bresson
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No meu doutorado, estudei a utilização da música nos filmes de Robert Bresson e morei um ano em Paris (de final de setembro de 2011 a outubro de 2012). Entre os 13 longas-metragens de Bresson, muitos se passam totalmente ou em parte em Paris, como é o caso de "As damas do Bois de Boulogne" (1945), "Pickpocket" (1959), "Uma mulher suave" ("Une femme douce", 1969), "Quatro noites de um sonhador" ("Quatre nuits d´un rêveur, 1972), "O diabo provavelmente" ("Le diable probablement", 1977) e "O dinheiro" ("L´argent", 1983). Sempre me interessei por descobrir os lugares dos filmes nas cidades, ainda mais no caso de um diretor que estudava tão intensamente. Porém, como o meu tema era a música, tinha era que ficar atrás de partituras em bibliotecas, conservatórios e guardadas com compositores. É claro que o interesse em descobrir os lugares permanecia, mas não era o principal e não fiz disso mais uma frente de pesquisa.
Para quem quiser mais detalhes da Paris de Bresson, aconselho o blog The Cine-Tourist, do professor Rolad-François Lack (recém-falecido e cujo blog é a grande inspiração deste aqui): https://www.thecinetourist.net/
Aconselho especialmente os links para os filmes "Pickpocket", "Uma mulher suave" e "Quatro noites de um sonhador": https://www.thecinetourist.net/bresson-in-paris---pickpocket.html e https://www.thecinetourist.net/bresson-69-71.html
Lá, vocês poderão encontrar muito mais detalhes e mesmo os percursos dos personagens. O que ponho aqui são alguns lugares que me chamavam a atenção no meio do meu cotidiano de pesquisa, entre tantos que aparecem nos filmes; por vezes,era algo que surgia por acaso, ou podiam ser coisas que até procurei intencionalmente, mas sem fazer esforço algum de tentar reproduzir os planos de Bresson. No trabalho de redigir essa cineviagem, dou-me conta novamente e ainda com mais força de uma característica da obra de Bresson: quase não há planos gerais e fica também evidente o uso quase que exclusivo da lente normal de 50mm. Além de não ter havido esforço algum de reprodução nas minhas fotos, o que se vê aqui é uma montagem feita muito tempo depois do momento em que essas fotografias foram feitas. Algumas delas, como as do Bois de Boulogne e a do Hipódromo de Longchamps foram feitas numa viagem anterior, em julho de 2008, quando o doutorado era ainda um projeto submetido a avaliação.
Assim, no filme "As damas do Bois de Boulogne" (1945), o segundo longa-metragem de Bresson, como o próprio título indica, o Bois de Boulogne é um local importante, especialmente, a parte em que fica a cascata. Os personagens Agnès (Elina Labourdette) e Jean (Paul Bernard) chegam a entrar no interior da gruta. Em 2008, achei a cascata, mas não sei se dava para entrar na gruta, ou, ao menos, não tentei chegar lá.
No plano no filme, vemos a cascata do outro lado, olhada por Agnès e a mãe:
As "damas" aparecem aqui sentadas num banco:
Seria este o banco? Aqui, uma dama de 2008:
Conforme o seu plano, a personagem Hélène (Maria Casarès) leva Jean para conhecer as damas, fingindo que o encontro foi acidental:
Seria esta a árvore que vimos nas fotos do filme?
Em outro momento do filme, Jean entra com Agnès na gruta da cascata:
Outra visão mais geral da cascata, onde vemos um buraco (seria a gruta em que os personagens entraram?):
Nessa mesma viagem de 2008, avistei de longe o Hipódromo de Longchamp, onde começa o filme "Pickpocket" (1959).
Evidentemente, no filme de Bresson, não há nenhum plano geral como esse e mal vemos as pistas dos cavalos (só ouvimos o som). Aqui, o protagonista Michel se preparando para o seu primeiro roubo de carteira:
Uma das sequências mais famosas do filme é a do roubo na Gare de Lyon, uma das estações de trem de Paris, de onde se pode viajar para o sul da França. Aqui, vemos Michel chegando à estação:
Toda a sequência se passa dentro da estação. Estive lá algumas vezes para pegar trem, mas não encontrei fotos do interior. Por outro lado, a Gare de Lyon foi um ponto de passagem constante no meu caminho para a Cinemateca Francesa, um dos lugares onde mais pesquisei e para onde, na maioria das vezes, ia de ônibus da minha casa. Assim, fiz questão de registrar o exterior da Gare (foto de abril de 2012):
Seguem alguns mapas para dar uma ideia da localização e das distâncias dos locais já mencionados (Bois de Boulogne, Hipódromo de Longchamp e Gare de Lyon). Pode-se ver também, no segundo mapa, a localização do cemitério Père Lachaise, que mencionarei mais adiante.
O protagonista Michel, antes de se juntar a um grupo de comparsas, realiza seus primeiros furtos sozinho no metrô de Paris, onde até hoje ouvimos avisos sonoros para termos cuidados com os pickpockets.
Essa parte do metrô de "Pickpocket" foi filmada numa estação desativada na época (em The Cine-Tourist, o professor Roland-François Lack mostra uma foto da estação Varenne. Durante as minhas pesquisas, era esse também o nome que aparecia como o local da filmagem). Infelizmente, tenho pouquíssimas fotos do metrô, embora tenha sido um meio de transporte muitíssimo utilizado (o principal) em todas as vezes em que estive em Paris. Seguem aqui duas fotos, uma do trem em movimento na estação Concorde (em fevereiro de 2012) e outra da estação Mirabeau (em julho de 2009):
No filme "O diabo provavelmente" (1977), o metro também aparece bastante numa de suas últimas sequências, quando o protagonista Charles segue com o colega Valentin para o cemitério Père Lachaise
A última sequência de "O diabo provavelmente" é, portanto, no cemitério Père Lachaise:
Em minha primeira estadia em Paris, em 1995, cheguei a visitar o Père Lachaise, ponto turístico comum nos roteiros de Paris, já que muitas pessoas importantes estão lá enterradas e ficamos à procura dos túmulos. Porém, depois dessa primeira vez, jamais retornei ao interior do cemitério e a foto que ponho aqui (de abril de 2012) foi produzida da janela do apartamento de um amigo, que, na época, morava em frente ao Père Lachaise.
O filme "Quatro noites de um sonhador" (1972) é uma adaptação do livro "Noites brancas", de Dostoievski. No filme, o sonhador recebe o nome de Jacques e a moça que ele encontra em quatro noites e por quem se apaixona (a Natasha do livro) é Marthe. Jacques acaba tão obcecado por Marthe, que vê o nome da moça até num barco no rio Sena.
Como as minhas preferências e prioridades são outras (música e cinema), vejam os barcos que cruzavam o meu caminho em vários dias diferentes:
"L´Atalante" é um filme de Jean Vigo de 1934. Foto de abril de 2012.
Bizet atrás de Notre Dame. Foto de julho de 2012.
Barco Chopin passando pela Conciergerie. Foto de setembro de 2012. Abaixo, detalhe do barco.
No entanto, uma das sequências de barco no Sena que mais chamam a atenção em "Quatro noites de um sonhador" é uma sequência noturna em que vemos um barco iluminado passar e ouvimos a música do grupo Batuki, formado por dois brasileiros (Marku Ribas e Wilson Sá Brito) e dois angolanos Mário Clinton e Mané Gomes.
"[...] um bateau-mouche moderno, de que contestamos as linhas falsamente elegantes na realidade, surge refinado,
transformado, tão nobre e belo quanto um navio do passado ou do futuro". Citação de artigo do jornal Le Figaro, de Claude Mauriac, Les nocturnes de Robert
Bresson, de 11 de fevereiro de 1972.
"Sob os arcos, passa e repassa, monstro brilhante, o bateau-mouche cheio de turistas e música" (frase traduzida por mim do francês em artigo do jornal Le Monde, de Jean-Marie Dunoyer, "Sur le nouveau film de
Robert Bresson – Les nuits bleues", de 03 de fevereiro de 1972.
“A passagem do bateau-mouche e de sua música toma
proporções inesperadas, permite gestos esplêndidos, sequência de sonho
acordado, plena de beleza e ternura". Artigo de Mireille Amiel, revista Cinéma, n.164, 1972, p.122.
Para ver e ouvir a sequência:
Também tirei fotos de alguns "monstros brilhantes":
Foto de fevereiro de 2012.
Fotos de julho de 2012
O filme "O diabo provavelmente" (1977) também tem muitas sequências às margens do Sena e começa com a passagem de um bateau-mouche:
Lendo os vários artigos e livros sobre filmes de Bresson durante a pesquisa, descobri que o lugar onde se passam várias das sequências de "Quatro noites de um sonhador" e de "O diabo provavelmente" ficam no Vert Galant. Mais especificamente, acabei descobrindo a localização (aí, realmente houve um pouco de intenção de minha parte) na "Ponta do Salgueiro-Chorão", como indicada aqui no mapa:
Foto minha de julho de 2012 com salgueiro-chorão (nessa época, o Brasil estava na moda):
O salgueiro parece ser este que aparece numa sequência diurna e outra noturna de "O diabo provavelmente":
Ou nessas sequências noturnas de "Quatro noites de um sonhador", também com jovens tocando instrumentos e cantando:
Em uma sequência diurna de "Quatro noites de um sonhador", o protagonista Jacques está num parque. Por meio do blog "The Cine-Tourist" vim a saber que é o parque que fica atrás da Notre Dame. E não é que eu tinha uma foto desse parque?
Foto de janeiro de 2012.
Talvez seja "Uma mulher suave" o filme em que mais aparecem lugares de Paris. Muitos deles estão no blog "The Cine-Tourist". Como expliquei anteriormente, não objetivei a busca desses lugares, mas, às vezes, algum deles aparecia sem querer, como o Boulevard Lannes (perto do Bois de Boulogne):
Foto de março de 2012. Abaixo, no filme:
Não costumo visitar museus de História Natural, mas, muito em função dessa sequência do filme, topei ir lá.
Foto de abril de 2012.
Ali ao lado, fica o Jardin des Plantes e a Ménagerie (um pequeno zoológico). É um dos primeiros locais que os protagonistas visitam, ainda antes de se casarem. O filme, como "Quatro noites de um sonhador", é uma adaptação de um livro de Dostoievski.
Foto de abril de 2012, início de primavera.
Há uma metáfora da mulher enjaulada em comparação com os animais:
Foto de dezembro de 2011.
O início de "O dinheiro" (último filme de Bresson) foi filmado no Boulevard Henri IV. Sabia disso por meio do material em que pesquisei. Mas o Boulevard Henri IV também foi um caminho utilizado muitas vezes para ir do apartamento em que morava para a Universidade Paris 3 - Sorbonne Nouvelle, para assistir às aulas do professor Michel Chion. A universidade não ficava longe da minha casa, mas era meio fora de mão em termos de conexão de metrô. Tanto é, que eu preferia fazer esse caminho, saltando do metrô na Bastilha, descendo a pé o boulevard Henri IV em direção ao metrô Sully-Morland, onde pegava a linha 7. Numa segunda-feira (era o dia da aula) de março de 2012, fotografei o Bazar d´Éléctricité, que aparece bem nitidamente no filme.
Fotos minhas
Chegada e partida dos rapazes do lugar onde estacionam suas motos. Vemos, ao fundo, o Bazar.d´Éléctricité.
Os rapazes se dirigem a uma loja de equipamentos fotográficos (é curioso que no livro de Tolstoi, adaptado para o filme, também é uma loja de fotografia) para ficarem com o troco do pagamento com uma nota falsa de dinheiro. No filme, há vários planos das portas transparentes da loja, em que podemos ver o seu exterior. Na última foto, dá para confirmar na placa de rua que é mesmo o Boulevard Henri IV.
Onde fica a loja? Será que ela ainda existe? Muita coisa muda em Paris, principalmente nessa região central da cidade. Aqui é a foto que tirei da calçada do Bazar, mostrando o outro lado da rua, embora não necessariamente Bresson tenha filmado no outro lado:
Pesquisando no Google Street View, penso que a loja pode mesmo ter sido num dos locais acima, pois parece que os locais visualizados da porta da loja no filme estão nos números 30 e 32 (ao lado do Bazar):
Para ter uma ideia da localização do Boulevard Henri IV:
Finalmente, menciono rapidamente o filme "A grande testemunha" (1966), cujo título original é "Au hasard Balthazar". O filme se passa na região dos Pireneus, mas soube pelas minhas leituras que a sequência do circo foi filmada no Cirque d´Hiver em Paris. Pois eu morava quase que em frente ao Cirque d´Hiver e, acreditem, nunca entrei lá, embora tivesse vontade só por causa dessa informação da locação do filme. Mas tenho só foto da parte de fora do circo:
Segue uma imagem de Balthazar (o protagonista, um jumento) no circo:
Pois não é que na rue de Bretagne, pertinho da minha casa, havia uma loja de quinquilharia (hoje não existe mais...) com um Balthazar!
Fotos de outubro de 2011
Deixo, finalmente, a indicação do meu livro para quem quiser saber mais sobre Robert Bresson:
Alvim, Luíza. "A música no cinema de Robert Bresson". Curitiba: Editora Appris, 2017.
Em 24 de fevereiro de 2020, numa parada muito rápida para trocar de trem em Marseille, indo de Nice a Paris, aproveitei para ir em busca de alguns lugares do livro "Em trânsito", de Anna Seghers (1900 – 1983). Nascida na Alemanha, judia e comunista ( seu nome de origem é Netty Reiling, Radvanyi é o sobrenome de casamento, sendo Anna Seghers seu pseudônimo) escreveu o livro nos anos 1942 – 1943, durante seu exílio no México, para onde fugiu num percurso inicial (Alemanha - Paris - Marselha) semelhante ao de seu protagonista. No filme Em trânsito (2018), o diretor alemão Christian Petzold faz uma adaptação em que recupera trechos do livro, sem alterar a época dos anos 1940, mantendo elementos de direção de arte porém, situando a história nos espaços de Paris e Marseille do final dos anos 2010. Foi o filme (maravilhoso) que me levou ao livro, que me impressionou muito também. Já tinha ido a Marseille diversas vezes, conhecia alguns espaços, outros, não e, durante a leitura,
Desde muito jovem, tinha curiosidade pela Ilha de Marajó e não sei explicar por quê. Vinham-me imagens de búfalos, rios, talvez alguma coisa de arte marajoara. Parecia-me um lugar muito, muito distante (e realmente é para quem mora no Sudeste do Brasil). Em 1994, tive a oportunidade de morar um mês em Oriximiná, cidade às margens do rio Trombetas, no Pará, mas que ficava bem longe da capital Belém e do Marajó. Somente muitos anos depois, em setembro de 2019, voltei ao Pará por ocasião de um congresso acadêmico em Belém e tentei tornar possível a ida ao Marajó. Curioso que, no início de 2019, ao preparar um curso sobre Villa-Lobos, vi o filme "Argila" (1942) de Humberto Mauro, cujo tema é justamente a cerâmica marajoara. Este mapa da ilha e do estado do Pará aparece no próprio filme: Inicialmente em Belém e antes do congresso, fui visitar o Museu do Forte do Presépio e lá me deparei com uma sala dedicada às culturas indígenas do Marajó e outras do esta
Talvez desde 2007 tenham chegado alguns filmes romenos a festivais e ao circuito brasileiro, mas foi com o filme alemão "Toni Erdmann" (2016), da diretora Maren Ade, que a cidade me chamou a atenção, principalmente pelas áreas verdes. Embora o filme não tenha tantas cenas em exteriores, há um clímax antes do epílogo, que se passa num parque. Essa imagem me ficou na cabeça. Visitei Bucareste no final de fevereiro de 2019. Tinha um pouco de neve, mas os parques em geral estavam verdes. Não revi "Toni Erdmann", portanto, as imagens que tinha da cidade e do filme eram muito fluidas. Este é o parque Ci șmigiu, perto do hotel onde estávamos. As latas de lixo de cada parque são diferentes, como pude perceber pelos outros que visitei. Pelas imagens do filme, chego à conclusão que o parque do filme é o Unirii e que seria próximo ao local onde mora a protagonista Ines (Sandra Hüller). Ela é uma executiva alemã, que trabalha numa empresa em Bucareste e tem sonhos carreiristas
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